Príncipe de Astúrias: a história do ‘Titanic brasileiro’ no fundo do mar de Ilhabela







Conhecido por ter 85% de sua área preservada, inúmeras cachoeiras, gastronomia requintada e praias paradisíacas, arquipélago no Litoral Norte de São Paulo também revela belezas submersas e desperta o “turismo de mergulho”

Gustave Gama
Ilhabela (SP)
– Viajar para Ilhabela é a certeza de estar em contato direto com a natureza, já que 85% de seu território é preservado pelo Parque Estadual. O arquipélago abriga a maior reserva de mata atlântica do planeta. Flora e fauna exuberante, cachoeiras abundantes, 39 praias paradisíacas, gastronomia de alto padrão, uma charmosa e variada rede hoteleira, cultura rica em tradições caiçaras e muita, muita história para contar.
Uma delas encontra-se no fundo do mar. A história do chamado ‘Titanic brasileiro’ - numa alusão ao vapor britânico que afundou dois anos antes no Atlântico Norte. Na verdade, trata-se da maior tragédia marítima ocorrida no país, o naufrágio do transatlântico “Príncipe de Astúrias”. Construído em 1914, na Escócia, a pedido da armadora espanhola Pinillos Y Yzquirdo Y Cia, o vapor tinha como objetivo unir Europa e a costa da América do Sul em viagens regulares de carga e passageiros.
Era madrugada do dia 7 de março de 1916, quase todos dormiam. Chovia forte, havia muita neblina, o que dificultava a visibilidade, primordial para a navegação à época. O vento leste soprava em grande intensidade e o navio chocou-se violentamente na laje submersa da Ponta da Pirabura, extremo sul da Ilha de São Sebastião - a maior do arquipélago de Ilhabela - abrindo uma enorme rachadura no casco.
Relatos de sobreviventes apontam para a explosão de duas das caldeiras, o que resultou no rápido naufrágio. Em menos de cinco minutos, o gigante de 150 metros de comprimento e 19 metros de boca (largura) estava no fundo do mar.
Pelo menos 450 pessoas morreram. Os números oficiais apontam para 445 mortos entre os 578 passageiros e tripulantes, embora existam versões que apontam para mais 800 imigrantes clandestinos nos porões do navio, todos fugindo da Guerra na Europa. Assim, mais de 1,2 mil pessoas teriam morrido neste acidente.
Oficiais sobreviventes relataram que na ponte de comando, o Capitão José Lotina e seu primeiro imediato teriam se suicidado com um tiro na cabeça ao ver a situação do Príncipe de Astúrias. Momentos antes da colisão, ao saber da proximidade com o costão rochoso, Capitão Lotina ainda lançou-se rápido ao telégrafo e deu a última mensagem para a casa de máquinas: “Toda força à ré”, ordenando também “Todo leme à boreste”, mas não havia mais tempo para o cumprimento das ordens. O Astúrias foi sugado pelo oceano em menos de cinco minutos.
Alguns sobreviventes agarraram-se a fardos de cortiça para manter-se na superfície da água e assim foram resgatados pelo navio inglês Vega. Muitos corpos chegaram às praias de Ilhabela e as histórias percorrem o imaginário de moradores até hoje. A bordo do navio também era transportada grande quantidade de metais como: estanho, amianto, cobre, zinco, aço, fios elétricos e vinho português, além de 12 estátuas de bronze, componentes do Monumento "La Carta Magna y las Cuatro Regiones Argentinas" do Parque Palermo, em Buenos Aires, e supostamente um valor de 40.000 libras-ouro.
Somente em 1989 foi autorizada a salvatagem, e assim, muitas partes dos destroços foram retiradas, como louças, talheres, cargas de metais, entre outros apetrechos. Em outubro de 1990 uma das estátuas de mulheres do monumento argentino foi recolhida e hoje está em frente ao Serviço de Documentação Geral da Marinha, na Ilha das Cobras (RJ).
Entretanto, em 1954, já havia ocorrido uma tentativa de recuperação de materiais do navio, em vão. A profundidade no local chega a 40 metros. “Foram três tentativas de salvatagem e a maioria das peças foi para a Marinha do Brasil”, relembra o mergulhador Jeannis Michail Platon, coordenador de operação no final da década de 80. Platon é autor do livro “Ilhabela e seus Enigmas”, que aborda os principais naufrágios ocorridos no arquipélago. Pelo menos 80 páginas do livro são dedicadas ao desastre do Príncipe de Astúrias. A publicação pode ser encontrada na Livraria Cultura, em São Paulo, e nas principais livrarias do Litoral Norte.
A comparação do maior acidente marítimo em águas brasileiras com a tragédia do Titanic é quase inevitável. Ambos estão entre as piores catástrofes marítimas de todos os tempos, com mais de mil mortos. O Titanic chocou-se contra um iceberg, enquanto que o Príncipe de Astúrias bateu numa laje de pedra. O acidente do Astúrias ocorreu quatro anos após o naufrágio do Titanic. A Prefeitura de Ilhabela pretende criar um Museu do Mar na cidade com as principais histórias, fotos e materiais recuperados nos naufrágios.
Turismo de Mergulho
O Príncipe de Astúrias é considerado um dos mais difíceis mergulhos do Brasil. Nele há mais de um fator complicador, obrigando os mergulhadores que decidam pela aventura a dominar técnicas avançadas. Em Ilhabela, existem pelo menos 18 navios submersos, alguns deles com maior facilidade para o mergulho. Entretanto, este tipo de mergulho só deve ser feito por quem já fez o curso preparatório, acompanhado de equipes profissionais. A cidade conta com empresas especializadas que oferecem as aulas e realizam as visitas aos naufrágios.


Serviço
Os interessados em cursos de mergulho e nas visitas aos naufrágios podem obter informações sobre as operadoras existentes em Ilhabela na Secretaria de Turismo, localizada na rotatória próxima à balsa. Telefone (12) 3895-7220.

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